23.12.07

A História, Essa Mal Amada

Não será muito comum ver pessoas num café a discutir o teorema de pitágoras ou outros temas da matemática, da física ou da biologia. Mas já sobre a História, toda a gente tem opinião e pensa saber algo. O passado é discutido como se toda gente tivesse estado lá. Acontece que mesmo entre quem de facto esteve lá, as versões divergem. Com excepção da Religião e do Futebol, não deve haver outra matéria tão discutida sem alicerces de conhecimento. Mas sempre será melhor do que ser igonrada, incompreendida ou apenas desprezada...

Muitas pessoas estão absolutamente desinformadas sobre a história de Portugal e misturam factos e lendas ou confundem e trocam parte dos dados. Mas quando, de forma pedagógica, se tenta corrigir os equívocos, as pessoas não aceitam que possam estar erradas.

Ainda há pouco tempo, alguém que tinha uma certeza inabalável numa inconsistência, até foi consultar uma amiga licenciada em História para continuar a argumentar que determinada rainha, esposa de Henrique VIII, era Portuguesa. A tal amiga confirmou e o indivíduo continuou ainda mais convencido da portugalidade de D. Catarina de Aragão. Mais, as pessoas que estavam à sua volta alinharam na mesma versão, ainda que nenhum fosse licenciado em História, como a tal amiga.

Às tantas, até eu, que tinha certeza que a rainha era filha dos Reis Católicos, portanto Espanhola, quase comecei a alimentar uma pequena incerteza… Por fim, consultadas as fontes mais actuais, não se verificou nenhuma descoberta de paternidade duvidosa, nem nenhuma gralha genealógica na árvore familiar da esposa #1 (de 6) do rei Inglês, pelo que finalmente tiveram todos que aceitar que nenhuma Portuguesa teve a infelicidade de ter desposado o famigerado Henry 8th.

Um histórico feliz Natal e um 2008 cheio de boas histórias.

30.11.07

Conjura e Restauração de D. João IV

A figura do duque de Bragança, antes de se tornar D. João IV, tal como D. João VI, tem sido menosprezada por alguns autores, que, intencionalmente ou não, tentam passar a imagem de um homem frouxo e irresoluto, que empalidece em comparação com a sua esposa ambiciosa e espanhola por sinal, a qual terá rugido um “antes morrer reinando, do que viver servindo”... No entanto, uma nova leitura revela um perfil mais condicente com um homem com verdadeiro sentido de Estado, como se diz hoje em dia. Afinal, quando o grupo popular (no sentido em que englobava todos os estratos sociais) se designa "conjurados" ou seja, homens de posição que se juntam em segredo, para arquitectar com todo o cuidado o derrube de um poder instalado, que já havia extinguido anteriores tentativas de dissidência. Estes não são uns meros cidadãos temerários, sem nada a perder; antes demonstram que tudo foi muito bem pensado e combinado, no mais profundo sigilo para não comprometer revolta. Do outro lado estava uma das maiores potências do mundo, bem armada e posicionada para esmagar qualquer rebeldia. Portanto, D. João IV, apesar de sempre vigiado e suspeito, teve a ousadia de perceber e ajudar a proporcionar as condições ideias para o sucesso da revolta, da qual esteve sempre em contacto, apesar de não ter participado directamente no assalto ao Paço, nesse dia 1º de Dezembro. E é claro que o super-herói musculado de capa e espada ou que se vira para a câmera e diz "hasta la vista baby" depois de despachar uma centena de mauzões, tem sempre mais encanto do que a personagem que manobra na sombra.

4.11.07

D. João VI

D. João VI tinha com certeza bastantes defeitos, mas muitos menos dos que se lhe atribuem. Penso que o retrato que melhor o descreve (e mais lisonjeiro), é o feito pelos Ingleses, talvez na sua gratidão por El-Rei ter obstinadamente cumprido a Aliança de Portugal com o Reino Unido, mesmo à custa do seu reinado em Lisboa... Por outro lado, a Historiografia das Repúblicas (as três, incluindo o Estado Novo, quer queiram quer não) nutre-lhe um desprezo máximo e tem usado este monarca e o seu reinado como o exemplo pior do que a Monarquia tem para oferecer, como se a Monarquia Constitucional fosse igual ao Absolutismo que então vigorava por quase toda a Europa. Nem tanto ao mar, nem tanto à terra, penso ser a imagem mais justa do sexto dos Joanes que reinaram em Portugal. D. João VI tem imenso a seu desfavor, começando logo com a sua aparência. Aquele aspecto de Porky Pig não lhe granjeia definitivamente muitas simpatias. Depois, a mãe louca também não é propriamente a melhor referência, assim como a debandada para terras de Vera Cruz aquando da 1ª Invasão Napoleónica; ou a associação do seu nome e dos seus descendentes à emancipação do Brasil, ou ao regímen Absolutista, ainda hoje abusivamente confundido com a Monarquia Constitucional, por alguns. Mas será o réu, perdão o rei culpado de todos estes "crimes"? Bem, com base em todas fontes que consultei até hoje, e principalmente, da comparação entre as correntes principais Inglesas e Portuguesas, surge o seguinte quadro: No dealbar do séc. X!X, Portugal era uma pálida imagem do que havia sido entre o séc. XV e o séc. XVI, onde Portugal era o país mais progressista da Europa. A Inglaterra e a França, que em 1452 ainda lutavam na Guerra dos 100 anos, enquanto Portugal já navegava o Atlântico Sul, por esta altura já avançam, literalmente, 'a todo o vapor' após encetarem a Revolução Industrial. Portugal não está em posição de enfrentar nenhuma das potências da altura, tendo ainda uma aliança com uma delas por respeitar ou quebrar. Equacionando as forças, uma era uma potência marítima (Inglaterra), a outra continental (França). A ligação marítima de Portugal às colónias era fundamental para a própria sobrevivência do reino. D. João VI, praticamente acabado de ser empossado, é confrontado com pressões terríveis de ambos os lados. O seu próprio Conselho de Estado está dividido. Tenta através da diplomacia e de todos os expedientes ganhar tempo e manter-se neutro. Chega-se mesmo a aventar um preço para Portugal pagar pela sua neutralidade. 1807 - Napoleão sabe que o bloqueio continental só pode resultar se os portos de Portugal e do Brasil estiverem efectivamente fechados aos Ingleses; e sabe também que Portugal nunca poderá submeter-se voluntariamente a essa pretensão. Com as tropas de Junot em marcha forçada, já dentro do território Português, o Rei ainda tinha esperanças de manter a neutralidade do país, pelo que as ordens eram da não hostilizar os Franceses. A fuga - inevitável. A história (e o próprio Napoleão, nas suas memórias) provou que estava certo. Claro que nunca saberemos o que teria acontecido, se tivesse decidido ficar e enfrentar os Franceses. Provavelmente seria visto com melhores olhos, mas o mais certo é que Napoleão tivesse investido muito mais em força contra Portugal, pessoalmente até, devastando o país ainda mais, com o resultado que tiveram os restantes países invadidos, com excepção da Rússia. A cobardia - há de facto uma certa dose de cobardia em fugir, seja para onde for for. Porém, por alguma razão é uma das estratégias mais bem sucedidas na Natureza. Os Árabes, pelos vistos antes de existirem os bombistas-suicidas, tinham um provérbio - "Fugir, para lutar mais um dia"; algo que teria possivelmente salvo a vida ao rei D. Sebastião, em Alcácer Kibir... e, talvez tenha... embora a reputação, essa perdeu-a de certeza... Certo é que ninguém chama cobarde a um árabe, pelo menos se der valor à vida. D. João VI foi um pouco cobarde, sim. Não pela fuga, mas pelos termos com que a desencadeou, sem deixar esperança ou uma orientação clara aos que ficavam para trás. Mas, dado o clima da época e a falta de preparação que D. João teve para reinar (não era o primogénito), ele próprio deve ter sofrido imenso com a decisão, que não foi só sua, mas de alguns conselheiros e da aliada Inglaterra. A desorganização da partida da Corte para o Brasil, indica que se tentou até ao último momento evitar a fuga. (Não seria a última vez que Portugueses seriam deixados à sua sorte – durante a 1º Guerra Mundial, em que a República recém-criada fez questão em participar, os soldados Portugueses, já de si mal-equipados, foram abandonados pelo governo e pelos seus superiores, facto que não seria esquecido pelo assassino de Sidónio Pais.) Porém, D. João VI mostrou, por outro lado, alguma coragem. Coragem que faltou a outros soberanos da Europa, que não usaram desafiar Napoleão. Ignomínia maior, pode-se dizer que foi a praticada pelo monarca espanhol, que, depois de fazer um acordo de protecção mútua com Portugal, pretendeu dividir o país com os Franceses, facilitando-lhes inclusive a passagem, e, involuntariamente, expôs-se ele próprio à ocupação. À vista do que se tinha passado em Espanha, onde o monarca espanhol havia sido capturado e substituído por um parente de Napoleão, era de facto imprudente continuar em Lisboa. Seja como for, sem este episódio negro na nossa História, não teria existido essoutro grandioso, da insurgência popular que abalou os "Conquistadores da Europa". Foi o início do declínio de Napoleão, como ele próprio reconheceu, com derrotas na frente Ocidental e depois na Oriental. O Brasil - Não é justo acusar D. João VI pela perda do Brasil. Pelo contrário, o rei, assim como D. Pedro, tinham uma visão muito mais ampla do que era Portugal e o Brasil - eles viam os dois territórios como um único - o Reino Unido de Portugal e Brasil. Foram os políticos de Lisboa, na sua visão mesquinha de conservar o Brasil como uma dependência secundária da Metrópole, como se fosse mais um território longínquo sem lei nem religião, que motivou a separação. O Brasil, tal como as restantes colónias, nunca foram suficientemente desenvolvidas (ou exploradas, chamem-lhe o que quiserem) por Portugal até ser tarde demais. Quanto a ser um soberano Absolutista, pai de D. Miguel, com tudo o que isso significa hoje, é preciso colocar as coisas no devido lugar. D. João VI foi um homem da sua época, assim como D. Miguel ou D. Pedro IV. E essa foi uma era de viragem. Foi ainda assim o primeiro rei Constitucional. Concluindo, D. João VI esteve longe de ser um rei pródigo, de pulso de ferro, à altura dos acontecimentos, mas não fica atrás da maioria das personagens do seu tempo. Não nasceu para ser rei, não nasceu para ser guerreiro (nem tinha físico para isso), mas acabou por ser mais influente do que a maioria dos seus pares. Na História de Portugal, cabe-lhe de facto o VI posto - atrás de D. Afonso Henriques, D. João II, D. João I, D. Manuel I, e D. Sebastião em importância e impacto nos destinos de Portugal.

21.7.07

O 1º Português

Recentemente, devido à polémica entrevista do laureado Nobel, José Saramago, a memória histórica do Fundador foi alvo de muitos poortugueses, com "p" pequenino mesmo, que culpam o nosso primeiro rei pelo estado actual da nação por D. Afonso Henriques "inventada". Esses descontentes não perdoam ao primeiro monarca do condado Portucalense primitivo, a audácia de ter separado os destinos do que viria a ser Portugal e Espanha. Para esses "iberistas", aparentemente, a culpa de Portugal estar hoje na "cauda" da Europa, em quase tudo, deve-se à atitude "irreflectida" de um jovem da nobreza Portucalense, há quase 900 anos, que ambicionava para si honras e mordomias sem fim... honras e mordomias que estes "iberistas" estão prontos a receber, em troca da identidade de um país com as fronteiras consolidadas mais antigas da Europa, com um povo, uma cultura e uma língua homogénea, e uma história das mais singulares e admiráveis do planeta.

Por muita lógica que uma "Ibéria" unida tivesse, não há lógica nem honra em desdenhar dos antepassados que nos deixaram um legado, do qual só nos podemos orgulhar, seja qual for a leitura que se faça destes mais de 800 anos de história. História essa que nem começa em D. Afonso I, mas ainda mais atrás, em Viriato e nos povos independentes, que resistiram enquanto puderam à conquista romana. Ainda hoje se discute se esse desejo latente de autodeterminação sobreviveu através das eras, com o reforço mais tarde, de uma identidade Sueva no Noroeste Peninsular... seja qual for o final da discussão, e aceitando-se que existiram também interesses mais mundanos por detrás da emancipação Portucalense, a verdade é que o filho do Conde D. Henrique prosseguiu um rumo já traçado e trilhado anteriormente, inclusive por seu pai; sublinhe-se que a ambição pessoal e a vã glória de mandar não são marcas associáveis a um rei que preferiu lutar a sua vida inteira, na conquista, na defesa e na consolidação de um território que "ofereceu" à Santa Sé. Diz-se que quando faleceu, deixou os cofres do novo estado bem cheios, coisa que não ocorre nos dias de hoje...

Mau grado a má reputação que algumas "más línguas históricas" fazem circular, D. Afonso Henriques, enquanto político e militar, foi um homem que serviu, sem se "servir" do país, mesmo contra o partido da mãe (não consta que tivesse batido em Dª Tareja - ou Teresa, embora a tenha mantido cativa, por força da guerra que os opunha) e fez disparar a velocidade da reconquista cristã para sul, ocupando-se igualmente do povoamento das terras recém-adquiridas, que na sua maioria, ficariam a fazer parte do novo reino, de maneira permanente. Não fosse o precalço de Badojoz, com o infurtúnio da sua queda do cavalo, caíram também as esperanças de termos hoje um território mais dilatado (mapa 1168). No entanto, à hora da sua morte (1185), deixou-nos muito mais terra do que a que recebeu dos seu antepassados, e mais do que isso, deixou um território com alicerces bem assentes para o futuro.

Corajoso, manhoso e inteligente, foi admirado (e muito temido) pelos adversários, ficando conhecido pelos mouros como Ibn Anrique (Filho de Henrique), apesar de se aventar também a hipótese de que não seria verdadeirament filho nem de D. Henrique nem de D. Tareja, porque esse teria nascido muito débil e incapaz de vir a ser o guerreiro e o lider que a história regista... (a lenda diz que o fiel aio Egas Moniz terá conseguido a recuperação milagrosa do infante em Cárquere, enquanto outros dizem que terá substituido o enfermo principe por um dos seus próprios filhos, o que explicaría a tal suposta agressão à "mãe" adoptiva e a dedicação extrema do "aio".) O primeiro rei foi também o monarca que mais anos reinou, tendo deixado uma herança e um exemplo difícil de igualar. Quantos puderem dizer o mesmo ou mostrar obra parecida, esses podem então censurar semelhante personagem da nossa história colectiva.

Já agora, se alguém é responsável pela ruptura da unidade ibérica, os culpados são os mouros que invadiram a península em 711...

15.7.07

Depois dos Tomates, as Espadas

Depois de Colombo/Cólon, a descoberta da Austrália, e do Políptico dito de S.Vivente, outro mito aparece dismistificado, em "Homens, Espadas e Tomates". A páginas tantas, mais concretamente pág. 166 a 168, Reiner Dahnhardt demonstra magistralmente que a espada erradamente atribuida ao rei fundador D. Afonso Henriques, tão abundantemente representada na estauária nacional e no estandarte e equipamento do Vitória de Guimarães, não podia ter pertencido ao nosso primeiro monarca, simplesmente porque é anacrónica em relação às pesadas espadas e montantes que se usavam na altura da fundação de Portugal, no Século XII. É fácil dize-lo agora, mas a verdade é que sempre me impressionou como D. Afonso I poderia ter talhado um reino, com tão pequena espada... será mais como a espada da estátua à esquerda, que embora quebrada, representa uma espada mais contemporânia de D. Afonso Henriques. Conhecendo-se a tipologia das espadas utilisadas na primeira fase da era das Descobertas, entende-se melhor a origem dessa espada, e até o seu provável dono, também ele Afonso, e um monarca de Portugal

4.7.07

Heróis, Espadas e Testosterona II

Ainda sobre o livro e o tema descrito no post anterior, acho que ficou bem explicito o significado do titulo da obra; mas de qualquer maneira, para que não restem dúvidas sobre a quem pertenciam os “tomates”, aqui fica um breve excerto do que pode ser encontrado no livro:

Fica a saber (Suleimão Paxá, um eunuco turco que comandava um exército enorme, durante o 1º cerco de Diu, e que endereçou uma missiva insultuosa a António da Silveira, capitaneava uma guarnição de apenas 600 Portugueses) que aqui estão portugueses acostumados a matar muitos mouros e têm por capitão António da Silveira, que tem um par de tomates mais fortes que as balas dos teus canhões e que todos os portugueses aqui têm tomates e não temem quem não os tenha!” in “Uma Curiosa Troca de Insultos” - "Homens, Espadas e Tomates".

Saudosos tempos estes, em que ainda havia tomates do tamanho de balas de canhão, agarrados a Portugueses. E dentes, porque em outra história de boa e fácil leitura, um soldadado Português, à falta de balas de mosquete, arrancou um dente e usou-o como munição...

Heróis, Espadas e Testosterona

Em "Homens, Espadas e Tomates", o Col. Rainer Daehnhardt reúne alguns exemplos épicos de coragem lusitana e do sacrifício individual de muitos Portugueses por esse mundo afora, quase sempre em desvantagem numérica avassaladora. Não fosse este último factor, poder-se-ia pensar que muitos dos actos de bravura e violência relatados, eram, vistos à luz mais humanista do presente, inconscientes exemplos de masculinidade.

Do ocidente ao oriente, o que mais impressiona é que a presença Portuguesa por terras alheias longínquas, foi sendo assegurada por um resumidíssimo punhado de homens, que, mau grado alguma superioridade na tecnologia do armamento, contou apenas com a sua coragem e o génio da gestão dos poucos contra os muitos – que para mais defendiam a sua terra e a sua religião…

Os Portugueses não defrontaram apenas indígenas “mal armados”; defrontaram exércitos numerosos e bem equipados de civilizações evoluídas e até um dos impérios mais poderosos e bem sucedidos do tempo – o Otomano – que tudo tentou para eliminar a presença Portuguesa da Ásia, a qual lhes veio estragar o monopólio do comércio das especiarias, que detinham até à abertura da rota do Cabo da Boa Esperança. Portugal, indirectamente, acabou também por contribuir para o abrandamento do ímpeto otomano na Europa de leste, salvando assim a Europa e iniciando a “idade de ouro” e de predominância da Europa, que duraria até a actualidade.

Enquanto assistimos às ficções de Hollywood, que na maioria dos épicos e filmes de acção nem tratam de figuras reais ou acontecimentos históricos, nem nos lembramos que temos muitos heróis, e alguns vilões, em histórias que dariam belíssimos filmes… porém, ainda que houvesse interesse, engenho e arte para passar tantos episódios épicos para a posteridade, nestes tempos do politicamente correcto e de tensão entre ocidente e oriente (como se viu com o filme “300”), seria sempre difícil avançar com um projecto semelhante, havendo em Portugal apenas um tímido exemplo, com o filme “Camões”…

9.6.07

O Código Da Vicente

Um povo sem memória é certamente um povo condenado a repetir os erros do passado. O pior, num país que apenas circunstancialmente se lembra da sua história impar, é certamente a maioria dos Portugueses não retirarem qualquer inspiração do melhor que o seu grandioso passado tem para oferecer... Uma das grandes deficiências que contribuem para esta situação, é a ausência de investimento na promoção da história nacional (com honrosas excepções), de uma forma que seja compreensível e envolvente para a generalidade dos Portugueses. Para além de nomes e datas, existe um exemplo, um significado útil, individual ou colectivo, por trás de cada acção histórica, que interessa muito mais explicar. A história, tal como a língua, é verdadeiramente a nossa identidade colectiva; o seu desprezo revela bem a falta de amor-próprio e a incompreensão dos nossos feitos passados. Aqueles que lutam para tornar a nossa história mais compreensivel, logo mais próxima de todos nós, encontram mais dificuldades do que apoios ou reconhecimento; mas o que importa afinal, não é a chegada, é o trajecto...

António Salvador Marques é um desses homens, que não tenho a honra de conhecer. Mas o seu admirável trabalho merece ser mais conhecido e mesmo ensinado - uma impressionante investigação a um dos mais famosos simbolos artisticos portugueses - os Painéis de S. Vicente de Fora (Museu de arte Antiga), explica e corrige, de uma assentada, várias incongruências associadas a essa obra e à "imagem de marca" da figura que tem sido apontada como o Infante D.Henrique (siga o link apenas se é daqueles que gosta de saber o fim, antes de ver o filme). António Salvador Marques vai de pista em pista, desmontando a enorme "charada" como ele lhe chama, sempre um passo à nossa frente, conduzindo-nos a surpreendentes descobertas e a ver o célebre políptico, literalmente com outros olhos. Concorde-se ou não com todas as intrepretações, somos convidados pelo autor a avaliar por nós próprios as respostas. E o que conta, não é afinal a viagem?

Para quem gosta de charadas e mistérios, não há necessidade de ir mais longe.

6.5.07

Hermanos Divididos

A Questão de Olivença não tem resposta fácil. E o pior, para Portugal, é que a questão é cada vez menos colocada... A região fronteiriça foi ocupada pelas forças Espanholas do General Godoy a 20 de Maio de 1801, com o auxilio das tropas de Napoleão, na que foi pomposamente designada como "Guerra das Laranjas", uma "guerra-relâmpago" que têm ainda hoje repercussão na disputa da soberania sobre a bela cidade, cheia de património histórico Português. Espanhola, efectivamente, há mais de 200 anos, Olivença e o seu território não se terá já tornado parte integrante do país vizinho, pelo que se pode chamar de "usucapião tácito", quer se queira, quer não? Infelizmente, parece-me que demasiado tempo passou já, para que o assunto volte a ser resgatado às páginas esquecidas da História. A meu ver, a antiga praça Portuguesa só terá hipotese de voltar a ser Portuguesa, se a Espanha insistir na questão similar de nome Gibraltar. Naturalmente, Portugal deverá fazer mais do que tem feito até aqui, e insistir por todos os meios na devolução do território, como aliás manda o direito internacional. A outra alternativa, seria o que resta da população Olivençana de origem Portuguesa, formar um movimento de "libertação" ou de auto-determinação... mas ainda que a região não tivesse sido propositadamente "colonizada" por Espanhóis para apagar as raízes lusitanas, quantos Portugueses trocariam condições de vida superiores, pela deprimida soberania Portuguesa, nos tempos que correm? Afinal, quantos não são "obrigados" a nascer em Badajoz, em paris, em Londres, etc....

6.4.07

Terra AUSTRALIS

A questão não é nova, mas espera-se que depois de mais este contributo, a discussão fique arrumada de vez. O continente Austral não podia ser desconhecida dos navegadores Portugueses, estando estes a curta distância, em Timor; há provas mais do que evidentes para suportar a precedência Portuguesa na descoberta da Austrália. Apenas, para o chauvinismo estrangeiro, é difícil aceitar que um pequeno e pobre país reclame essa honra. Neste feito, o nome a alinhar ao lado de outros verdadeiros grandes Portugueses, é Cristovão (mais um) de Mendonça.

20.3.07

“LUGARES HISTÓRICOS” EM PALMELA

O Auditório da Biblioteca Municipal de Palmela, local onde se realizou a apresentação do novo livro do Prof. José Hermano Sariava, sábado dia 10 de Março, foi pequeno para albergar cerca de centena e meia de populares que não quiseram faltar à palestra e à posterior sessão de autógrafos que o conhecido Historiador dinamizou, ao seu estilo.

O livro “Lugares Históricos de Portugal” foi encomendado pelas Selecções do Reader's Digest, que lançou um livro semelhante nos EUA, com grande sucesso. A diferença, salientou o Professor, é que há muitos mais espaços históricos em Portugal do que nos EUA “porque o que faz os lugares históricos “Não é o espaço, é o tempo!”

Esta edição é mais do que um livro de História. Dar a conhecer o património histórico, na perpectiva de promover o turismo, é a ideia subjacente por detrás da da obra.

“Nos somos um ponto único da Europa! O livro procura chamar a atenção para muita coisa que eu próprio não conhecia” - sublinhou.

Há muitas zonas do interior que se estão a sentir esquecidas e abandonadas; é por isso que o Professor, à beira dos 90 anos, faz as frequentes viagens que o levam onde pouca gente vai, para chamar a atenção para essas regiões cheias de coisas interessantes, para mostrar os motivos que as pessoas têm para lá ir. “Este livro, de certo modo, condensa o assunto dos programas. Eu não falo de nenhum sítio onde não tenha estado. Nada daquilo é escrito em segunda mão; é um resumo da minha experiência pessoal de passar por lá.”

Os Editores designaram cerca de 400 páginas para esta obra, mas, segundo o Professor, esse espaço não é suficiente para incluir todos os lugares históricos de um país com praticamente 900 anos. O Prof. Saraiva teve assim que limitar o número de terras que entraram nesta compilação, onde “as várias Lisboas” que compõem Lisboa (Medieval, Barroca, etc.), ocupam um espaço considerável e proporcional à sua importância como capital do país, desde há vários séculos. Como não podia deixar de ser, Palmela, a terra onde está radicado, também mereceu destaque - “Palmela é um dos mais extraordinários miradouros, na Europa!” Na sua opinião, é mesmo muito surpreendente que Palmela não tenha tido um lugar mais de destaque no concurso das “7 Maravilhas de Portugal”. O Historiador, ao seu jeito, disse que acha que não há “maravilhas” em Portugal, visto que fomos sempre um país pobre. Mas se tivesse que escolher um monumento nacional, “uma das jóias, menos comuns no mundo, e mais simbólicas, escolhia a Torre de Belém. É um monumento artístico, feito pelo rei D. Manuel I, para dizer “cá estamos nós, cá está Portugal!”. Mas conclui que a escolha não é fácil, quando existem tantos concorrentes, cada um com os seus valores. O mesmo se aplica em relação ao outro concurso do momento, “Os Grandes Portugueses”, cuja final será já no próximo fim-de-semana. “Não se pode comparar a Rosa Mota com o Egas Moniz! Gosto muito da Rosa Mota e gosto muito do Egas Moniz; mas entre os dois, como escolher? ”

O Prof. José Hermano Saraiva não hesita em afirmar que há interesse público pela História, e destaca o papel da RTP, que no seu percurso de meio século, tem prestado um serviço importante ao país. Já em relação à sua notada ausência na Gala dos 50 anos da Estação Pública, o Historiador referiu, modestamente, que a sua presença não era essencial.

8.3.07

“ALCIPE LUSITANA”

Nome de rainha, nome de mulher do povo, Leonor, segundo alguns, é nome de origem Árabe, para outros deriva do Grego, mas em ambas as línguas o significado aponta para “luz ou iluminação”.Távora, em contraste, é nome que significou tortura e sofrimento, no Século XVIII. Nascida em Lisboa em 1750, Leonor de Almeida Lorena e Lencastre, mais conhecido pelo seu título de Marquesa de Alorna, era filha primogénita do Marquês de Alorna e Conde de Assumar, D. João de Almeida Portugal, e de sua mulher, D. Leonor de Lorena e Távora. Essa herança de nome e de sangue aos Marqueses de Távora, executados a mando do marquês de Pombal, devido ao seu alegado envolvimento numa emboscada ao rei D. José I, foi funesta para a jovem Leonor, que aos 8 anos de idade foi enclausurada no Convento de Chelas, em companhia de sua mãe e sua irmã, já o seu pai foi atirado para os calabouços.

Os quase 20 anos que passou como reclusa não impediram que Dona Leonor recebesse uma cuidada formação linguística, literária e científica, coisa rara para as mulheres da época, mesmo as “bem-nascidas”. Leu obras dos maiores escritores iluministas, como Racine, Rousseau, Voltaire e Diderot, que cedo lhe despertaram o gosto pela literatura e pela poesia. Contudo, as leituras que mais a marcaram devem ter sido as cartas que o seu pai lhe enviava, escritas com o próprio sangue, à falta de outra tinta, no cárcere. Teve ainda como mestre o padre Francisco Manuel do Nascimento, mais conhecido pelo seu pseudónimo nos ciclos poéticos da Arcádia Lusitana, de Filinto Elísio. Também ela tomou, como era uso no tempo, o nome literário de Alcipe. As suas poesias libertaram-se das grades e alcançaram grande fama vindo mais tarde a ser publicadas sob o título de Poesias de Chelas.

Dona Leonor e a sua família, saíram finalmente da prisão em 1777, depois do afastamento do Marquês do Pombal, por ordem de D. Maria I que havia sucedido a D. José. Tinha então vinte anos. Pouco depois, casou com o conde de Oeynhausen, que viera a Portugal com seu primo, o alemão conde de Lippe, contratado em 1762 pelo marquês de Pombal para organizar e comandar o nosso exército. O casamento realizou-se em 1779, apadrinhado pela rainha D. Maria I e pelo rei seu marido, D. Pedro III. Partem em viagem pela Europa, passando pelas cortes de Espanha de França e de Áustria, sendo a marquesa e poetisa recebida e homenageada pelos respectivos monarcas, imperadores e até pelo papa Pio VI. Fica viúva aos 43 anos, em 1793, ficando com seis filhos pequenos a seu cargo. Foi viver primeiro para Almeirim, onde patrocinou o ensino de raparigas daquela vila e imediações; mudou-se depois para outra propriedade que também possuía em Almada. Apesar das dificuldades financeiras, recebe em sua casa célebres figuras da vida literária, como Bocage (Elmano Sadino) e mais tarde, Alexandre Herculano, entre outros frequentadores do seu salão cultural onde se debatem as novas ideias políticas e também as novas correntes estéticas e literárias. As suas ideias liberais, no entanto, não agradavam ao Intendente Pina Manique; porém, pior foram as invasões Napoleónicas do princípio do século XIX, que a obrigaram a exilar-se em Londres, entre 1804 e 1814. Continua a escrever poemas, mas tem o desgosto de ver a filha ser amante do invasor Junot. De regresso a Portugal, mais uma vez um membro da família havia caído em desgraça, pelo que ao fim de dez anos de muita luta, obteve a reabilitação da memória de seu irmão D. Pedro, que por ter integrado a Legião Lusitana que acompanhou Napoleão à Rússia (morrendo no regresso), fora condenado como traidor à pátria. Foi somente nessa época que passou a usar do título de 4.ª marquesa de Alorna, e 6.ª condessa de Assumar, como herdeira de seu irmão. Faleceu aos 89 anos de idade, deixando seis volumes de "Obras Poéticas" e sendo uma mulher Ímpar na sua época, uma das mais notáveis vozes do pré-romantismo em Portugal. Alexandre Herculano chamou-lhe a "madame de Staël portuguesa."

11.2.07

1 Conto de Rei$

Em antecipação ao Dia de S. Valentim, vulgo “Dia dos Namorados”, que veio substituir a festa romana pagã da fertilidade - ou Lupercalia - que se realizava em meados de Fevereiro, recorda-se aqui um casal real e Real, que foi talvez dos poucos a encontrar o amor e a vive-lo dentro do casamento político arranjado.

D. Pedro V, mais conhecido talvez por ter circulado de mão em mão de 1979 a 1991, nas notas de 1 conto, ou seja, 1000$00 escudos, viveu na realidade um conto de amor com a sua Princesa – a esposa e rainha Dona Estefânia – a quem se deve o Hospital do mesmo nome, em Lisboa.

Juntos desenvolveram inúmeras iniciativas de solidariedade e de apoio ao progresso do país (contemporâneo do “Fontismo”), que apesar do seu curto reinado (6 anos), foram mais duradouras que os seus curtos percursos de vida, abreviados pelas mesmas deficientes condições sanitárias que tentaram combater.

Este rei português viveu e morreu definitivamente sob o signo do amor, sendo um dos seus cognomes “O Bem-Amado”, o que traduz a boa memória, que de D. Pedro e de D. Estefânia, ficou na população e na história de Portugal.

1.2.07

Real Tragédia

Por detrás do Príncipe Real, estava um jovem resoluto, corajoso, que teve uma boa educação e morreu a tentar defender a família; faleceu muito cedo, antes dos 21 anos, antes de poder deixar grande obra ou descendência - porém, teve e tem o seu lugar no trono da história. D. Luis Filipe, o seu pai, a sua mãe e o seu irmão, tiveram a infelicidade de viverem numa época insensata, de radicalismo, de vistas curtas, que os acabou por mergulhar - e ao país - no desperdício. O Jovem príncipe herdeiro, contudo, enquanto viveu, deu provas de ser um digno representante da Casa Real e de Portugal. Por detrás do penúltimo Rei de Portugal, estava um homem bom, um cientista e um homem das artes, como os seu antecessores de Bragança Saxe-Coburgo-Gotha. Tanto Dom Carlos I como D. Manuel II, foram reis incompreendidos e injustiçados. Quem for ao Palácio da Pena, ou ao Paço Ducal de Vila Viçosa, não poderá deixar de se impressionar com o testemunho tão vívido ainda presente, da vida familiar intima daquela família malograda...

31.1.07

Tragédia Real

Dia 1 de Fevereiro de 2007 completam-se 99 anos, desde que S.A.R. D. Carlos I e o Príncipe Herdeiro D. Luís Filipe foram assassinados, em público, na Praça do Comércio, perante os olhos da Rainha, esposa e mãe, que também viu o outro seu filho ser alvejado. Porém, o príncipe D. Manuel e a Monarquia sobreviveram ao ferimento; e “Rei Morto-Rei Posto” – o príncipe que não nasceu nem pediu para ser rei, veio a sê-lo, por mais dois anos, como D. Manuel II.

Quase 100 depois, ainda não foi completamente assumido esse crime hediondo, que parece ter sido o molde de mais dois, também famosos – o assassínio do Arquiduque da Áustria-Hungria, poucos anos depois, em 1914 (evento que despoletou a 1ª Guerra Mundial); e o também ainda misterioso homicídio de John F. Kennedy.

Todos estes actos terroristas, radicalizados, têm em comum vários elementos, como sejam a mais alta figura do Estado ter perdido a vida de modo violento, enquanto se deslocavam num veiculo aberto, na companhia das esposas, em público e em tempo de paz.

Estes actos bárbaros tiveram consequências bastante negativas, logicamente e primeiramente para as vítimas, para as famílias, e posteriormente para os próprios países (ou ainda para além deles).

A situação do país, tanto em 1908 como em 2007, pode encontrar um certo paralelismo no seguinte extracto do poema Pátria, de Guerra Junqueiro - um autor que é conhecido também por não morrer de amores pela Monarquia:

«- Os políticos: «Dois partidos "monárquicos", sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, na hora do desastre, de sacrificar à monarquia ou meia libra ou uma gota de sangue.

- A burguesia: «Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não discriminando já o bem do mal.»

- O povo: «Humilde e macambúzio, fatalista e sonâmbulo, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai, um povo que eu adoro, porque sofre e é bom.»

- A economia: «Perda de gente e perda de capital, autofagia colectiva, organismo vivendo e morrendo do parasitismo de si próprio.»

15.1.07

O Homem que Empenhou as Barbas

Esse GRANDE homem, chamado D. João de Castro (1500 —1548) , antes de empenhar as próprias barbas para pagar a reconstrução das muralhas de Diu, tentou empenhar os ossos do filho, que em defesa desse território Indiano tinha perecido. Apenas, os restos mortais de D. Fernando de Castro, não estavam em aptos a serem exumados. Dirigiu então uma carta aos habitantes de Goa, onde entregava as barbas em penhor de um empréstimo para pagar as obras da fortaleza de Diu. Não pediu nada para ele próprio, nem nada aceitou para si. Recebeu da população de Goa uma soma maior do que tinha pedido, e a devolução do seu penhor.

Não foi apenas mais um militar, foi um homem de ciência e um filósofo, contemporâneo de personagens como o matemático Pedro Nunes (1502 - 1578), ou o Apóstolo das Índias, S. Francisco Xavier (1506 – 1552). Um Gigante Português, com certeza. Vale a pena conhecer mais.

14.1.07

Grande Portugal

Se há um mérito inquestionável na sondagem RTP "Grandes Portugueses", ele é ter relembrado que este pequeno país teve gente de muita qualidade, em quantidade quase inesgotável; gente cuja dimensão individual ultrapassou a das estreitas fronteiras de Portugal. Gente que marcou o seu tempo, e o que havia de vir, não havendo muitos países - para mais pequenos - a poderem-se gabar de ter influído tanto no mundo. Gente essa, que espera, no mínimo, que os que os sucedem no presente, não desmereçam do seu exemplo, da sua obra e do seu esforço pelo país...